Nota Informativa

Novidades direito e política da concorrência

31/07/2025

2º Trimestre 2025

A cada trimestre, apresentamos as principais novidades em direito da concorrência em Portugal e na União Europeia. Nesta edição, estarão em destaque uma investigação aprofundada no setor imobiliário digital, decisões judiciais relevantes nos mercados do tabaco e da banca, bem como atualizações sobre sanções e regulação nos setores das plataformas digitais, reciclagem, desporto, tecnologia, investimento estrangeiro, e ainda auxílios de Estado na União Europeia. Uma síntese da atualidade, para apoiar os desafios do mercado e dos nossos clientes.

PORTUGAL

I. Autoridade da Concorrência

PLATAFORMAS IMOBILIÁRIAS NO RADAR DA ADC

No dia 30 de maio de 2025, a Autoridade da Concorrência (AdC) adotou uma decisão de passagem a uma investigação aprofundada (Fase II) relativamente à aquisição pela Idealista do Portal47 (empresa-mãe da Kyero, uma plataforma online de anúncios imobiliários, destinada a particulares que residam na Alemanha, no Reino Unido e no norte da Europa).

O recurso a uma fase de investigação aprofundada, apesar de cada vez mais frequente, não é comum e é reservado para casos particulares, onde a AdC tem sérias dúvidas quanto à compatibilidade da operação com as regras da concorrência.

II. Tribunais nacionais

REJEIÇÃO DO RECURSO DA ADC MANTÉM ANULAÇÃO DA AQUISIÇÃO DE EMPRESA DE DISTRIBUIÇÃO DE TABACO

No dia 28 de maio de 2025, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) considerou inadmissível o recurso da Autoridade da Concorrência (AdC) contra a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), num processo que culminou num desfecho incomum no panorama nacional com a anulação judicial de uma decisão de não oposição a uma operação de concentração.

A decisão do TRL já tinha confirmado a anulação pelo Tribunal da Concorrência de Lisboa (TCRS) da decisão da AdC de não oposição da compra pela MidSid da Dois Lados, uma empresa dedicada à distribuição grossista de tabaco.

Na visão do TCRS, a decisão da AdC contém erros nos pressupostos quanto ao mercado da distribuição de produtos de tabaco em Portugal, o que compromete a legalidade da decisão da AdC.

DESFECHO NA INVESTIGAÇÃO DA BANCA EM SUSPENSO

No dia 7 de junho de 2025, o Tribunal Constitucional (TC) recusou apreciar os recursos interpostos pela Autoridade da Concorrência (AdC) e pelo Ministério Público no processo que envolve a alegada prática de troca de informações comerciais sensíveis entre 11 instituições bancárias em Portugal. Esta decisão previa a aplicação de coimas no valor total de 225 milhões de euros, cuja maior fatia se concentrava em 4 bancos: CGD (82 milhões de euros), BCP (60 milhões de euros), Santander (35,65 milhões de euros) e BPI (30 milhões de euros).

Estes recursos tinham por objeto a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, que considerou que a prática em causa estaria prescrita. Desta feita, o TC afirmou que não teria competência para conhecer deste recurso.

A AdC anunciou que iria reclamar desta decisão. Trata-se de uma derradeira via processual para tentar reverter o entendimento judicial quanto à prescrição, num processo que se prolonga há mais de uma década e que conheceu múltiplos incidentes processuais, incluindo um pedido de reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça da União Europeia

UNIÃO EUROPEIA

I. Comissão Europeia

QUANDO A RECICLAGEM DE CARROS SAI CARA

No dia 1 de abril de 2025, a Comissão Europeia (CE) e a Autoridade da Concorrência do Reino Unido anunciaram a conclusão de uma investigação conjunta relativa a alegadas práticas concertadas no mercado do abate e reciclagem de veículos em fim de vida, que supostamente ocorreram entre 2002 e 2017. A investigação concluiu com a aplicação de coimas no valor total superior a 550 milhões de euros, repartidas entre 15 fabricantes automóveis, várias subsidiárias e duas associações setoriais, tanto na União Europeia como no Reino Unido.

Segundo esta investigação, os fabricantes envolvidos terão coordenado o seu comportamento em relação às empresas de desmantelamento de automóveis em fim de vida. Além disso, terão coordenado não publicitar o grau de reciclabilidade e reutilização dos veículos, impedindo os consumidores de comparar as ofertas comerciais das várias empresas à luz da sua performance em termos de reciclagem dos veículos. A Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis foi também sancionada por ter alegadamente facilitado a prática em causa.

O caso destaca-se pela sua dimensão e relevância, envolvendo um número significativo de grandes fabricantes automóveis europeus e asiáticos.

PRIMEIRA DECISÃO DE FASE II AO ABRIGO DO FSR

No dia 4 de abril de 2025, a Comissão Europeia (CE) publicou a sua primeira decisão de compromissos na sequência de uma investigação aprofundada ao abrigo do Regulamento sobre Subvenções Estrangeiras (Foreign Subsidies Regulation – FSR). A decisão diz respeito à aquisição do grupo PPF Telecom, com operações na Europa, pela Emirates Telecommunications Group Company, uma operadora dos Emirados Árabes Unidos controlada pelo fundo soberano estatal EIA (Emirates Investment Authority).

A CE concluiu que várias contribuições financeiras dadas pelos Emirados Árabes Unidos – incluindo garantias ilimitadas e financiamentos concedidos por bancos estatais ou sob controlo estatal – constituíam subvenções estrangeiras suscetíveis de falsear o mercado interno.

Para ultrapassar as preocupações identificadas, a CE aceitou compromissos comportamentais, incluindo a eliminação da garantia ilimitada, restrições ao financiamento da atividade da PPF na União Europeia e a nomeação de um mandatário de monitorização.

Esta decisão estabelece um precedente relevante na aplicação do FSR, demonstrando a sua capacidade de condicionar aquisições de empresas por entidades apoiadas por países terceiros.

PRIMEIRAS SANÇÕES AO ABRIGO DA DMA CONTEMPLAM A APPLE E A META

No dia 23 de abril de 2025, a Comissão Europeia (CE) aplicou as primeiras coimas ao abrigo da Lei dos Mercados Digitais (DMA), após investigação às empresas Apple e Meta. As empresas foram ainda condenadas a corrigir estas violações.

A empresa Apple foi sancionada em 500 milhões de euros por alegadamente ter limitado a possibilidade de os utilizadores escolherem ofertas fora da App Store (cláusulas anti-steering), restringindo a capacidade de os apps developers de publicitar meios alternativos para a venda dos seus produtos. Ao mesmo tempo, a CE fechou uma investigação contra a mesma empresa, após esta ter alterado a forma de os utilizadores escolherem as soluções default nas definições dos seus telemóveis.

A empresa Meta foi sancionada em 200 milhões de euros por ter alegadamente imposto um modelo (conhecido como “Consente ou Paga”) que obrigaria os utilizadores a escolherem entre: (i) ou consentir na utilização pela Meta dos seus dados para publicidade direcionada; (ii) ou pagar uma subscrição mensal de um serviço sem publicidade – quando a DMA obriga a que os utilizadores que não deem tal consentimento tenham acesso a uma versão equivalente do produto em causa.

ACORDOS DE NO POACH ENTRE AS PRÁTICAS FORTEMENTE CENSURADAS À DELIVERY HERO E À GLOVO

No dia 2 de junho de 2025, a Comissão Europeia (CE) aplicou uma coima global de 329 milhões de euros às empresas Delivery Hero e Glovo, por alegadamente terem celebrado acordos no-poach (de não contratação de pessoal) e de divisão de mercado, bem como pela alegada partilha de informações sensíveis.

As práticas de no-poach têm vindo a merecer uma atenção crescente por parte das autoridades da concorrência, incluindo da AdC, que as elegeu como uma das suas prioridades para 2025.

De destacar igualmente o facto de a investigação ter concluído que a coordenação entre as duas empresas foi facilitada através de uma participação minoritária. Segundo a CE, a participação minoritária da Delivery Hero na Glovo foi determinante para a coordenação entre as duas empresas, permitindo à primeira obter informações comercialmente sensíveis da Glovo, bem como influenciar as decisões desta última.

As empresas em causa transigiram com a CE, obtendo por isso uma redução nas coimas aplicadas

II. Legislação

INVESTIMENTO ESTRANGEIRO ENTRA EM FASE DE NEGOCIAÇÕES

No dia 17 de junho de 2025, iniciaram-se as negociações interinstitucionais entre o Parlamento Europeu, Conselho e Comissão Europeia (CE) para a revisão do Regulamento 2019/452, que estabelece um regime de análise dos investimentos estrangeiros diretos na União (FDI).

Nestas negociações será discutido, entre o mais, a divisão de poderes entre a CE e os Estados-Membros, a análise de investimentos greenfield (i.e., a construção de instalações operacionais de raiz) ou o âmbito dos setores a abranger por este Regulamento.

Prevê-se que as negociações se prolonguem até ao final de 2025, sendo improvável que a revisão se torne plenamente aplicável já em 2026.

III. Tribunal de Justiça

REJEIÇÃO DE RECURSO DA RYANAIR MANTÉM AUXÍLIOS DE ESTADO À LOT

No dia 2 de abril de 2025, o Tribunal Geral da União Europeia (TGUE) rejeitou o recurso da Ryanair relativo ao auxílio estatal polaco de 650 milhões de euros à companhia aérea LOT. O auxílio tinha sido autorizado pela Comissão Europeia (CE) ao abrigo do Quadro Temporário de Auxílios de Estado adotado em resposta à Pandemia de COVID-19.

O TGUE validou a análise da CE de que o auxílio foi proporcional, não excedendo o mínimo necessário para assegurar a viabilidade da empresa.

Entre o mais, o TGUE afirmou que os Estados-Membros não estão obrigados a atribuir auxílios a todas as empresas que contribuem para a conectividade do seu território, sendo certo que a decisão da CE demonstrava a necessidade de manter a contribuição da LOT para a economia polaca.

Embora a pandemia tenha terminado, os seus efeitos económicos continuam a ser avaliados nos tribunais da UE, como evidenciado nesta decisão.

ISENÇÃO FISCAL PARA INFRAESTRUTURAS FERROVIÁRIAS PODE NÃO CONFIGURAR UM AUXÍLIO DE ESTADO

Num acórdão de 29 de abril de 2025, em resposta a um pedido de reenvio por um tribunal polaco, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) estabeleceu que uma isenção de imposto sobre o património imobiliário equipado com infraestruturas ferroviárias colocadas à disposição dos transportadores ferroviários não deverá, em princípio, constituir um auxílio de Estado, por não compreender uma vantagem seletiva. No entanto, o TJUE deixa a análise concreta ao tribunal nacional que colocou a pergunta ao TJUE.

O TJUE considerou que a isenção não era uma medida seletiva porque, sendo definida em termos gerais e abstratos, estava disponível para qualquer contribuinte que possuísse e cedesse a infraestrutura em causa, dessa forma não se restringindo esta medida a empresas com determinadas características ou atividades.

O TJUE relevou também o facto desta medida não fazer parte de um sistema desenhado segundo parâmetros manifestamente discriminatórios, servindo, ao invés, objetivos orçamentais e ambientais.

O Acórdão do TJUE tem especial relevância por clarificar os critérios de aferição da seletividade em matéria fiscal relativamente à prossecução de objetivos de interesse geral.

FALTA DE LEGITIMIDADE PROCESSUAL AFASTA RECURSOS CONTRA MEDIDAS DE APOIO CHECAS

No dia 14 de maio de 2025, o Tribunal Geral da União Europeia (TGUE) rejeitou, por falta de legitimidade, os recursos interpostos pela Telly, operadora checa de televisão por satélite, e pela associação checa de operadores de satélite (ČASO) contra a decisão da Comissão Europeia (CE) de março de 2021. Nessa decisão, a CE determinou que uma medida da República Checa no setor da televisão não constituía um auxílio de Estado, não tendo iniciado um procedimento formal de investigação.

A decisão destaca-se por sublinhar os requisitos de legitimidade em ações contra decisões da CE que, após exame preliminar, concluem pela inexistência de auxílio.

Na visão do TGUE, as partes não conseguiram demonstrar em que medida a decisão da Comissão de não aprofundar a sua investigação acerca desta medida estatal teria violado os direitos processuais das partes recorrentes. Também não lograram demonstrar que a medida estatal em causa seria suscetível de afetar significativamente a sua posição no mercado. A não verificação destes requisitos conduz à inadmissibilidade da ação.

O TGUE entendeu ainda que a decisão da CE não podia ser qualificada como ato de alcance geral isento de medidas de execução, uma vez que a aplicação da medida dependia sempre de decisões individuais das autoridades nacionais. Nesse sentido, as recorrentes não teriam legitimidade processual para contestar os atos em questão.

A APLICAÇÃO DAS REGRAS DA CONCORRÊNCIA À REGULAÇÃO DESPORTIVA EM DISCUSSÃO

No dia 15 de maio de 2025, o Advogado-Geral (AG) Nicholas Emiliou emitiu conclusões em três processos onde se discute a compatibilidade de regras adotadas por associações desportivas com as regras da concorrência e do mercado interno da União Europeia.

Entre o mais, o AG defendeu a interpretação restritiva do princípio de inaplicabilidade destas regras da concorrência e do mercado interno às disposições adotadas por motivos exclusivamente não económicos e estritamente desportivos (conhecida como a “exceção do desporto”).

Por outro lado, na visão deste AG, ainda que os acordos no-poach (através dos quais duas ou mais empresas se comprometem a não contratar pessoal entre si) sejam, em geral, restritivos por objeto, a verdade é que em casos específicos poderão não o ser (exigindo-se uma análise cuidada para se poderem qualificar como tal), ou poderão mesmo ser justificados – como ilustrado num dos casos analisados, em que o AG considerou que um acordo entre equipas de futebol, celebrado durante a pandemia COVID-19, poderia ser justificado à luz das circunstâncias excecionais.

Esta abordagem sublinha a importância crescente deste tipo de práticas, em linha com a atenção reforçada que lhes tem sido dedicada pelas autoridades da concorrência e, em especial, pela AdC.

GOOGLE ANDROID ENFRENTA NOVO OBSTÁCULO

No dia 25 de junho de 2025, a Advogada-Geral (AG) Juliane Kokott defendeu a rejeição do recurso interposto pela Google contra a decisão do Tribunal Geral que confirmara, em larga medida, a decisão da Comissão Europeia (CE) no processo Google Android, que culminou numa coima de €4,1 mil milhões. Em causa estão alegadas práticas relacionadas com dispositivos móveis Android, supostamente destinadas a reforçar a posição dominante do motor de pesquisa da Google.

Entre o mais, a AG defendeu que não é necessário que a CE faça uma análise de como seria o mercado na ausência das práticas em causa, bastando uma análise ao comportamento dos consumidores. Por outro lado, na opinião desta AG, não seria necessário proceder ao teste do “Concorrente Igualmente Eficiente” (As-Efficient Competitor) para avaliar os efeitos de exclusão das práticas, em razão da posição e importância da Google.

Trata-se de um dos casos mais emblemáticos da aplicação recente do artigo 102.º TFUE à economia digital.

Perante um contrato de prestação de serviços, cujo objeto é uma empreitada em que não foi fixado prazo certo, mas apenas um prazo estimado, não entra em mora a parte que termine a prestação 6 dias úteis após o prazo estimado

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