Novidade Legislativa

Orçamento do Estado para 2023 Principais medidas fiscais

16/01/2023

Foi publicada a Lei n.º 24-D/2022, de 30 de dezembro, que aprova a Lei do Orçamento do Estado para 2023 (‘OE2023’) e que inclui algumas alterações face à Proposta de Lei do Governo cujos principais tópicos já tivemos oportunidade de analisar (veja aqui). É agora oportuno analisar, também, as principais alterações introduzidas pela Assembleia da República na fase da discussão na especialidade e aprovadas pelo parlamento em votação global final.

IRS

Mais-valias imobiliárias realizadas por não residentes

As mais-valias resultantes da alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis e da cessão onerosa de posições contratuais ou direitos inerentes a bens imóveis, auferidas por não residentes, passam a ser englobadas e tributadas às taxas gerais de IRS apenas sobre 50% do seu valor, desde que não sejam imputáveis a estabelecimento estável situado em Portugal.

Na redação anterior, estes rendimentos encontravam-se sujeitos a uma taxa autónoma de 28%, não beneficiando expressamente da tributação em apenas 50% do seu valor, o que gerava uma discriminação face aos sujeitos passivos residentes, já reconhecida como ilegal pelo Tribunal de Justiça da União Europeia e colmatada por via jurisprudencial. Com a alteração, passa a estar em vigor um sistema de equiparação de regime entre residentes e não residentes.

Deduções à coleta

Com a aprovação da Lei do OE2023, passa a ser dedutível à coleta do IRS o IVA suportado:

  • com a aquisição de bilhetes de transportes públicos (e não apenas os passes); e
  • com a aquisição de assinaturas de publicações periódicas (jornais e revistas), incluindo digitais, tributados à taxa reduzida do IVA.
Resgate do valor dos PPR sem penalizações

Até ao final de 2023, passa a ser permitido o resgate sem penalizações do valor dos PPR para pagar prestações de contratos de crédito garantidos por hipoteca sobre imóvel, prestações do crédito à construção ou beneficiação de imóveis e entregas a cooperativas de habitação mesmo quando estejam em causa entregas com antiguidade inferior a 5 anos.

A este propósito, notamos que a Lei n.º 19/2022, de 21 de outubro, determinou que, também até ao final de 2023, seja possível fazer o resgate dos PPR sem penalização e sem restrição quanto à sua finalidade, até ao limite mensal do IAS.

Novo regime de tributação dos criptoativos

O novo regime de tributação dos criptoativos foi porventura o que sofreu mais alterações em sede de discussão da especialidade da Proposta de Lei para 2023, com vista ao seu alinhamento com o regime previsto no Regulamento relativo aos mercados de criptoativos (MiCA).

Neste âmbito, foi aprovada a definição de criptoativos inicialmente proposta, ficando clarificado que não se inclui naquele conceito os criptoativos únicos e não fungíveis com outros criptoativos. O que significa a exclusão dos NFTs (non-fungible tokens) deste novo regime.

Para fácil referência, sintetizamos as alterações relevantes:

Rendimentos de categoria B

Em termos gerais, mantiveram-se as novas regras de tributação propostas, e em particular, quanto ao regime simplificado inicialmente proposto (quer em sede de IRS, quer em sede de IRC), aplicando-se, no entanto, diferentes coeficientes em função da natureza da operação, a saber: (i) os rendimentos relacionados com a emissão de criptoativos são considerados em apenas 15%; e (ii) os rendimentos provenientes da mineração de criptoativos são considerados em 95%.

Pretendeu-se, com esta alteração, penalizar as atividades de mineração por se entender que são pouco sustentáveis do ponto de vista ambiental.

Rendimentos de categoria E

A aprovação da Lei do OE2023 vem considerar como rendimentos de capitais os decorrentes de quaisquer outras operações referentes a criptoativos, sendo, assim, clarificado que a remuneração decorrente de operações relativas a criptoativos (como ‘staking’) é classificada como rendimento de categoria E.

Estes rendimentos estão dispensados de retenção na fonte (independentemente da forma que revistam – ou seja, mesmo quando pagos em dinheiro) e, quando sejam pagos sob a forma de criptoativos, são tributados no âmbito da categoria G (mais-valias), mas aquando da alienação dos criptoativos recebidos.

Rendimentos de categoria G

Os rendimentos decorrentes da alienação onerosa de criptoativos, fora do âmbito de uma atividade empresarial ou profissional, são tributados de acordo com o regime das mais-valias e assim sujeitos à taxa de 28%, com opção pelo englobamento.

Ficam excluídos de tributação os ganhos e perdas decorrentes da alienação de criptoativos que não constituam valores mobiliários detidos há pelo menos 365 dias, optando-se na versão final da Lei do OE2023 pela designação de “exclusão” em vez de “isenção” inicialmente proposta.

Adicionalmente, no âmbito das normas anti-abuso, foi clarificado que não beneficiam desta exclusão de tributação os rendimentos auferidos por sujeitos passivos, ou devidos por qualquer pessoa/entidade quando estes não forem residentes fiscais noutro Estado-Membro da UE ou do Espaço Económico Europeu ou noutro Estado ou jurisdição com o qual esteja em vigor Convenção para evitar a Dupla Tributação (‘CDT’) ou acordo bilateral ou multilateral que preveja a troca de informações para fins fiscais.

A perda da qualidade de residente em território português é equiparada a uma alienação onerosa, sendo o rendimento tributável determinado pela diferença positiva entre o valor de mercado à data da perda da qualidade de residente e o valor de aquisição, acrescido das importâncias necessárias e efetivamente suportadas inerentes à aquisição. Consideramos que esta medida é suscetível de ser questionada ao nível do Direito Europeu.

A Lei do OE2023 aprovada na especialidade, vem, também, clarificar que se aplica a regra do FIFO (first in first out) aos criptoativos, considerando para efeitos de apuramento do saldo das mais-valias que são alienados aqueles que foram adquiridos há mais tempo.

IRC

Regime de reporte de prejuízos fiscais em IRC

O limite à dedução de prejuízos fiscais de 5 anos mantém-se em vigor relativamente aos apurados antes de 1 de janeiro de 2023 se, por referência ao exercício do prejuízo fiscal, tiver ocorrido simultaneamente conversão de ativos por impostos diferidos em crédito tributário que tenham resultado da não dedução de gastos e variações patrimoniais negativas com perdas por imparidade em créditos e com benefícios pós-emprego ou a longo prazo de empregados (‘REAID’). Nos demais casos, a dedutibilidade de prejuízos não tem limite temporal.

Regime de tributação de grupos de sociedades sediadas numa Região Autónoma

A Lei de OE2023 clarifica que, para a aplicação do regime de tributação de grupos a sociedades com sede em região autónoma, basta a sua sujeição à taxa de IRC mais elevada aplicável naquela região, em vez da sujeição à taxa normal mais elevada do regime geral de IRC.

Dedutibilidade dos gastos com passes sociais

As despesas suportadas com a aquisição de passes sociais em benefício do pessoal passam, com a aprovação na especialidade da Lei de OE2023, a ser consideradas como realizações de utilidade social e, assim, a ser dedutíveis ao lucro tributável em 150% do seu valor, ao invés de 130% como era previsto anteriormente.

IVA

Aumento do limite de isenção para os trabalhadores independentes

Passam a beneficiar da isenção do IVA os sujeitos passivos que (i) não dispõem de contabilidade organizada; (ii) não praticam operações de importação, exportação ou atividades conexas; e (iii) não exercem atividades de transmissão de bens e serviços do setor de desperdícios, resíduos e sucatas recicláveis, e que não obtenham no ano anterior, um volume de negócios superior a € 15.000.

Porém, o referido limite é alterado progressivamente nos seguintes termos:

 

Alargamento do prazo da entrega da declaração de IVA do segundo trimestre

O prazo da entrega da declaração de IVA de junho ou do segundo trimestre é prolongado de 20 de agosto para 20 de setembro, podendo o pagamento ser efetuado até 25 de setembro.

IMT

Alterações ao regime isenção na compra para revenda

Nos termos do Código do IMT, as aquisições de prédios para revenda podem beneficiar de uma isenção de tributação quando: (i) o adquirente exerça uma atividade de compra de imóveis para revenda; e (ii) o imóvel seja revendido no prazo de três anos. Esta isenção é aplicável automaticamente ou por via de reembolso.

Com a aprovação da Lei do OE2023, os requisitos para a aplicação automática desta isenção de IMT passam a ser mais exigentes, passando a ser exigível ao sujeito passivo que exerce normal e habitualmente atividade de compra para revenda que comprove que, nos 2 anos anteriores, foram revendidos, em cada um desses dois anos, prédios adquiridos para esse fim. A regra anterior referia-se apenas à atividade prestada no ano anterior, deixando de relevar a aquisição para revenda, atendendo-se apenas aos imóveis adquiridos que são revendidos.

Alterações ao valor tributável nas permutas

Caso os imóveis que tenham sido objeto de permuta sejam transmitidos no prazo de um ano a contar da data da permuta, deixa de se aplicar a regra segundo a qual o IMT incide apenas sobre a maior das diferenças de valor (diferença de Valor Patrimonial Tributário ou diferença de valores declarados) entre os imóveis permutados.

Esta alteração configura uma norma anti-abuso através da qual a permuta é tratada nos termos gerais como uma compra e venda, caso os bens imóveis permutados sejam transmitidos no prazo de um ano.

IMI

Isenção de imóveis classificados

A partir de 2023 passa a ser exigido um procedimento municipal de reconhecimento do direito à isenção de IMI no caso dos imóveis de interesse municipal, devendo ser os municípios a fazer esta avaliação, “quando a classificação é uma competência dos municípios ou quando os prédios individualmente considerados integram conjuntos ou sítios classificados como monumentos nacionais”.

Imóveis localizados em zonas de pressão urbanística

Os municípios passam a poder majorar a taxa do IMI aplicável aos imóveis localizados em zonas de pressão urbanística, tal como definidas em diploma próprio:

  • até 100% nos casos em que estejam afetos a alojamento local;
  • até 50% nos casos em que, tendo por destino a habitação, não se encontrem arrendados, quando o sujeito passivo do imposto seja uma pessoa coletiva ou outra entidade fiscalmente equiparada;
  • até 25% nos casos em que, tendo por destino a habitação, não se encontrem arrendados para habitação ou afetos a habitação própria e permanente do sujeito passivo.

Imposto do Selo

Isenção nas operações de reestruturação de créditos habitação

No âmbito dos mútuos constituídos no âmbito do regime legal do crédito à habitação e até ao montante do capital em dívida, estão isentas de Imposto do Selo entre 1 de novembro de 2022 e 31 de dezembro de 2023, as seguintes operações:

  • alteração do prazo do empréstimo;
  • prorrogação do prazo;
  • celebração de novo contrato de crédito para refinanciamento da divida, estando igualmente abrangidas as garantias prestadas; e
  • constituição de garantias no âmbito de mútuos constituídos no âmbito do regime legal do crédito à habitação até ao montante do capital em dívida, quando deles resulte mudança da instituição de crédito ou sub-rogação nos direitos e garantias do credor hipotecário.

Pacote de incentivos fiscais

Incentivo à capitalização das empresas

Das várias medidas previstas no pacote de incentivos fiscais previsto na Proposta do OE para 2023, apenas o incentivo à capitalização das empresas foi alterado em sede de votação na especialidade.

A Lei do OE2023 cria o Regime Fiscal de Incentivo à Capitalização das Empresas (‘RFICE’) que substitui o Regime da Remuneração Convencional do Capital Social (‘RCCS’), bem como o Regime de Dedução por Lucros Retidos e Reinvestidos (‘DLRR’).

Neste âmbito, foram introduzidas alterações que definem os critérios de elegibilidade para beneficiar deste novo regime.

Assim, inclui-se, para efeitos da dedução ao lucro tributável de uma importância de 4,5% do montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis, os lucros contabilísticos do período de tributação que sejam aplicados em resultados transitados, em reservas ou resultem no aumento do capital social.

Em consequência, considera-se o valor líquido das saídas, em dinheiro ou em espécie, realizadas a favor dos sócios, em resultado de redução do capital social ou de partilha do património, bem como as distribuições de reservas ou resultados transitados.

Neste seguimento, passa a excluir-se os aumentos de capitais próprios elegíveis quando resultem de:

  • Entradas realizadas em dinheiro, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital da sociedade beneficiária, que sejam financiadas por aumentos de capitais próprios elegíveis noutra entidade;
  • Entradas realizadas em dinheiro, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital da sociedade beneficiária por entidade com a qual o sujeito passivo esteja em situação de relações especiais, que sejam financiadas por mútuos do próprio sujeito passivo ou por outra entidade com a qual estão ambos em relações especiais; ou
  • Entradas realizadas em dinheiro, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital da sociedade beneficiária, por uma entidade que não seja residente para efeitos fiscais noutro Estado-Membro da União Europeia ou no Espaço Económico Europeu ou noutro Estado ou jurisdição com o qual esteja em vigor convenção para evitar a dupla tributação internacional, acordo bilateral ou multilateral que preveja a troca de informações para fins fiscais.

Por fim, para efeitos do apuramento do montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis verificados nos nove períodos de tributação anteriores, apenas se consideram os aumentos líquidos verificados nos períodos de tributação que se iniciem em ou após 1 de janeiro de 2023. À semelhança do RCCS e com o DLRR, este incentivo não concorre para o resultado da liquidação tendo sido, também, incluído no Código do IRC.

Rendimentos de arrendamento estudantil

Passam a estar isentos de IRS e IRC os rendimentos prediais obtidos no âmbito dos programas municipais de oferta para alojamento estudantil, que tenham por objeto contratos de arrendamento e subarrendamento destinado a estudantes deslocados, e que cumpram os limites de renda fixados.

 

Síntese das principais medidas do OE

  • São alterados os limites de isenção relativamente ao IRS Jovem, bem como o aumento a percentagem de isenção, para os 50% no primeiro ano, 40% no segundo ano, 30% nos terceiro e quarto anos e 20% no último ano.
  • São equiparados os residentes e não-residentes para efeitos de tributação de mais-valias imobiliárias, passando a ser tributado 50% do saldo das mais e menos-valias imobiliárias obtidas por não residentes, deixando assim de se aplicar a taxa autónoma de 28%.
  • Até ao final de 2023 é possível obter o reembolso total ou parcial do valor dos PPR para pagamento de prestações de crédito à habitação, dispensando-se a obrigação de permanência mínima de 5 anos.
  • É criado um regime de tributação dos criptoativos e os rendimentos dos criptoativos são enquadrados como rendimentos empresariais (categoria B), como rendimentos de capitais (categoria E) ou como mais‑valias (categoria G).
  • É eliminado o limite temporal de dedução dos prejuízos fiscais, sendo o limite quantitativo de dedução dos prejuízos reduzido para 65% (em vez e 70%) do lucro tributável.
  • É eliminada a necessidade de autorização prévia do Ministro das Finanças para a utilização de prejuízos fiscais em caso de reorganizações societárias, bem como a dedução do excedente dos gastos de financiamento líquidos não utilizado em períodos anteriores, caso se cumpra com o critério da existência de razões económicas válidas.
  • É alargado o âmbito de aplicação da taxa reduzida de IRC de 17% a lucros tributáveis até € 50.000 (em vez de € 25.000) passando aquela taxa a aplicar-se também a empresas de pequena-média capitalização (Small Mid Cap).
  • É criado um regime de incentivo à concentração de PME ou Small Mid Cap realizadas entre 2023 e 2026, permitindo-se a aplicação excecional da taxa reduzida de IRC nos dois exercícios posteriores à operação de reorganização caso as empresas percam a natureza de PME ou Small Mid Cap for força da operação de reestruturação realizada.
  • Os veículos movidos exclusivamente a energia elétrica com um valor de aquisição igual ou superior a € 62.500 passem a ser tributados autonomamente à taxa de 10%.
  • Os gastos e as perdas com eletricidade e gás natural podem ser majorados em 20% para efeitos de IRC.
  • As despesas suportadas com a aquisição de passes sociais são dedutíveis ao lucro tributável em 150% do seu valor.
  • É criado um incentivo fiscal que promove a melhoria dos salários dos trabalhadores majorando-se os gastos com as valorizações salariais em 50%.
  • É aumentado, progressivamente, o limite máximo de isenção de IVA para trabalhadores independentes para € 13.500 em 2023, para € 14.500 em 2024 e para € 15.000 a partir de 2025.
  • Para obtenção de isenção automática de IMT na compra para revenda, o adquirente tem de comprovar que em cada um dos dois anos anteriores revendeu prédios antes adquiridos para esse fim.
  • Estão isentas de Imposto do Selo as alterações de prazo e as prorrogações de contratos de crédito à habitação, a celebração de um novo contrato para refinanciamento da dívida, bem como a prestação de novas garantias associadas a estes créditos, mediante o cumprimento de determinados requisitos e desde que realizadas entre 1 de novembro de 2022 e 31 de dezembro de 2023.
  • É criado o Regime Fiscal de Incentivo à Capitalização das Empresas, que substitui o RCCS e o DLRR, passando a poder ser deduzida ao lucro tributável das empresas o valor correspondente a 4,5% e de 5% para as empresas qualificadas como micro, pequenas, médias ou de pequena-média capitalização [Small Mid Cap], do montante de aumento líquido dos capitais próprios elegíveis.
  • Mantém-se em vigor as contribuições setoriais já existentes: (i) Contribuição sobre o setor bancário (CSB) e (ii) Adicional de solidariedade sobre o setor bancário; (iii) Contribuição extraordinária sobre o setor energético; (iv) Contribuição extraordinária sobre a indústria farmacêutica e (v) Contribuição extraordinária sobre os fornecedores da indústria de dispositivos médicos do Serviço Nacional de Saúde (SNS); e (vi) Contribuição especial para a conservação dos recursos florestais.
  • Estão isentos de IRS e IRC os rendimentos prediais obtidos no âmbito dos programas municipais de oferta para alojamento estudantil que tenham por objeto contratos de arrendamento e subarrendamento destinado a estudantes deslocados e que cumpram os limites de renda fixados.

 

Downloads

Mantenha-se informado

Please note, your browser is out of date.
For a good browsing experience we recommend using the latest version of Chrome, Firefox, Safari, Opera or Internet Explorer.